23 agosto, 2012

UMBANDISTA SIM, Macumbeiro também!

Muitos Umbandistas se ofendem quando chamados de "macumbeiros", mas isso não tem a ver com o significado da palavra e nem com sua identidade religiosa e, sim, com o que fizeram desta palavra.

Se o "outro" me chama de "macumbeiro", no tom de suas palavras eu percebo o quanto está carregado de preconceito, ou não. Principalmente por conhecer ou desconhecer o que seja "macumba". Ignorantes da fé e religiosidade alheia em atitude de discriminação se utilizam desta palavra, "macumba", lhe atribuindo significado negativo.

Logo a palavra "macumba" assumiu, popularmente, uma grande quantidade de significados, positivos e negativos, mas que no inconsciente coletivo vem assumindo um peso resultante da grande massa que discrimina os cultos brasileiros e afrobrasileiros, como Umbanda e Candomblé.

Talvez a estrutura da palavra não ajude muito. Eu mesmo e alguns conhecidos, anos atrás, dizíamos pertencer à "Boacumba", com a intenção de desassociar a idéia de uma "coisa" que é "Má".

Me lembro de recomendações feitas por mim e por outros irmãos com estas palavras: "Quando lhe perguntarem se você é macumbeiro diga: sou umbandista, com muito orgulho!"

Resposta pronta para dar a um ignorante/preconceituoso, arrematada com: "macumba não é religião e sim um instrumento de percussão", apenas para dar ao incauto seu atestado de ignorante, certificado por um "macumbeiro".

Ao mesmo tempo entre nós umbandistas, sempre fica a brincadeira num misto de ironia e  descontração: "bando de macumbeiro", "seus macumba", "já vem ou já vai, macumbeiro", "tá macumbando o quê por aí?". Coisa de quem gosta de irreverência consigo mesmo, de gente que ri exatamente do que lhe oprime.

Algo como a diferença entre cor e raça. Por exemplo: O outro não pode me chamar de "preto", pois preto é cor e negro é a raça (etnia). Mas eu, que sou negro, posso me chamar de preto e chamar o outro de preto, afinal o preconceito não está na palavra e, sim, na forma como a empregamos. Ao mesmo tempo, estamos rindo e ironizando o outro que me chama de "preto" e acredita que com isso poderia me diminuir.

Em qualquer dicionário vamos encontrar uma definição larga e genérica para a palavra macumba, mas em todos deverão ser citados aspectos positivos e negativos da mesma.

Câmara Cascudo em seu "Dicionário do Folclore Brasileiro" define a palavra Macumba: "Instrumento musical africano (de percussão), que dá um som de rapa; o mesmo que candomblé, correspondendo ao xangô pernambucano. Diz-se mais comumente macumba que candomblé, no Rio de Janeiro, e mais candomblé que macumba, na Bahia. Macumba, na acepção popular do vocábulo, é mais ligada ao emprego do ebó, feitiço, coisa feita, muamba, mais reunião de bruxaria que ato religioso como o candomblé."

Mesmo em Câmara Cascudo, ficamos por entender algumas nuances e aspectos da palavra em sua sutileza de origem etimológica e determinação de um culto, pois quando se generaliza candomblé, xangôs, macumba e, porque não, umbanda, estamos colocando coisas diversas num único saco, que costuma-se chamar de afro-brasileiro.

Logo, o termo "macumba" é reconhecidamente uma identificação de religiosidade brasileira sincrética, a qual se associa  com as religiões citadas e outras. A carga pejorativa se dá no momento em que a mesma palavra passou a ser utilizada como sinônimo de "Magia Negra" (Magia Negativa), que em nada define a prática de uma raça e, sim, a intenção de fazer o mal por meio de ritual, seja lá qual for.

A relação do termo com o Rio de Janeiro é bem simples. "Macumba" é o nome ao qual se auto identificaram os religiosos Bantu (Angola, Congo, Cabinda, Cachéu...) estabelecidos no Rio de Janeiro por força do tráfego negreiro, é o nome da Religião Afrobrasileira que se estabeleceu naquele estado com suas peculiaridades e identidade bem próximas ao que hoje chamamos de "Candomblé de Angola" ou "Candomblé de Caboclo", com influências de "Cabula" e "Kimbanda Africana", um culto sincrético simples e inclusivo, muito próximo e parecido com a Umbanda. Quando surge a Umbanda no Rio de Janeiro, já havia grande preconceito com a "Macumba".

Minha amiga querida e sacerdotisa Adelaide Scritori, conta que, certa vez, um africano teria lhe dito que em sua língua, creio que no quimbundo, entre outras definições, a palavra Macumba quer dizer: "Dançar sobre as águas", o que dá um tom e interpretação encantadora para a palavra. Afinal se está relacionada ao instrumento musical (macumba), também está relacionada à dança macumba, esta que se faz ao som de tal instrumento, dentro de um contexto, claro.

Com o movimento federativo umbandista da década de 1950, houve uma valorização da Umbanda, surgiu a legalização dos terreiros e uma crescente construção teológica de seus fundamentos, até hoje diversos na forma e unos na essência. Assim, muitos adeptos da "macumba", do culto afro-brasileiro-bantu, migraram para a Umbanda, outros simplesmente passaram a se identificar como umbandistas, sem no entanto, mudar nada em suas práticas.

Este foi um período em que surgiram homens como o saudoso Tata Tancredo, precursor do Culto Omolocô. Em sua dialética afirmava que tudo é Umbanda, todos os cultos com influência ou origem afro seriam Umbanda, reflexo da força que a Umbanda conquistou na época. Algo muito parecido com o que alguns umbandistas fazerm ao se declarar "espíritas", o que, a rigor, define a doutrina de Kardec, por este codificada, mas que no sentido popular se torna quase que uma palavra genérica confundida com outra: espiritualista. Mas o genérico neste caso é algo que não define nada, apenas divaga e as vezes esconde uma vergonha, não se sabe do que, afinal todos deveriam ter orgulho e muito de sua fé e religiosidade.

Como conclusão, embora tenha uma carga pejorativa popular associada a "Magia Negra", a palavra Macumba também se refere de forma indistinta a todas as práticas de religiosidade afro-indígenas-brasileiras, que sejam afros, afro-brasileira, afro-indígena e brasileira mesmo, como é o caso da Umbanda. Esta palavra não define nem especifica qual religião o "macumbeiro" segue, mas indica que faz parte de um bojo de religiosos que tem alguns valores em comum como, por exemplo, a ausência de um "livro sagrado" ao qual sua prática estaria dogmaticamente vinculada.

Outra característica forte comum a todos "macumbeiros" é a liberdade de viver com menos preconceitos, pois o discriminado aprende logo cedo a não discriminar. Uma vida de menos moralismos e falsos pudores e mais amores, sorriso, canto e alegria, características fundamentais que vêm das entranhas de todo "bomcumbeiro", quero dizer bom macumbeiro...

Logo, quando perguntam qual a minha religião, minha resposta na ponta da língua é: "Sou Umbandista, com muito orgulho!"

Mas também me sinto muito a vontade de me sentir parte de um grupo discriminado e que faz desta mesma discriminação motivo de graça e descontração, pois com os Orixás aprendi que cada um tem seu valor pelo que é e não pelo rótulo que carrega.

Sou Macumbeiro, Macumbeiro Umbandista, sou até Espírita Umbandista, Afro-Indígena-brasileiro Umbandista... Sou UM, só mais UM, macumbeiro...

UMBANDA NÃO É PARA O MEU EGO,
UMBANDA NÃO É PARA A MINHA VAIDADE,
UMBANDA NÃO É PARA ME PROMOVER...
Umbanda é para minha FÉ,
Umbanda é para meu AMOR,
Umbanda é para meu AUTO CONHECIMENTO,
Umbanda é para meu EQUILÍBRIO,
Umbanda é para minha DISCIPLINA,
Umbanda é para minha EVOLUÇÃO,
Umbanda é para minha VIDA...


Texto de Alexandre Cumino

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